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CINEMA "CRONICAMENTE
INVIÁVEL"
Filme retrata país fraturado e
insano
JOSÉ GERALDO COUTO da Equipe de Articulistas
Se existe um cinema da crueldade -entendido como cinema
que investiga a crueldade, não como um cinema cruel-, Sérgio Bianchi pode
ser considerado um de seus mais legítimos representantes. Em
"Cronicamente Inviável", essa investigação -já evidente em seu longa
anterior, "A Causa Secreta"- ganha um caráter sistemático e abrangente.
Trata-se, aqui, de identificar e expor os mecanismos de opressão e
alienação que unem os habitantes de um país num abraço de morte. O
Brasil que aparece em "Cronicamente Inviável", a partir do entrechoque de
personagens das mais variadas origens regionais, étnicas e sociais, é um
país fraturado e insano, em tudo distante do idílio da miscigenação
harmônica que vimos nas comemorações dos 500 anos. Por meio de breves
situações dramáticas -quase esquetes- habilmente amarradas e do insolente
discurso em "off" do personagem do escritor-pesquisador (Umberto Magnani),
o filme desmonta uma a uma as visões ideológicas dominantes no país. A
ideologia da "felicidade compulsória", consagrada nas bundas e trios
elétricos do Carnaval baiano, literalmente deságua num fio de urina que
desce pela sarjeta até banhar um menino de rua dormindo ao relento. A
ideologia do trabalho eficiente e civilizador resulta numa agência de
empregos que fornece índios para trabalhar de figurantes em
comerciais. A ideologia da caridade produz uma guerra de crianças
miseráveis por brinquedos doados por uma burguesa cheia de
culpa. Imagens enfáticas, estridentes, mas nunca gratuitas ou
inverossímeis. É o país que é estridente, gratuito,
inverossímil. Bianchi radiografa com lucidez implacável a cadeia de
espoliação do mais fraco pelo mais forte. Os últimos elos dessa cadeia
infernal são os índios, que não têm ninguém para oprimir, e a natureza,
que não tem como se defender da devastação. O filme comprova a evolução
do cineasta como narrador e como diretor de atores. Todas as histórias se
"amarram" num restaurante em São Paulo, e a narrativa joga, no limite da
metalinguagem, com a construção do passado de cada personagem. Se
subsiste ainda uma certa irregularidade de tom e de acabamento entre as
várias partes, isso é sobejamente compensado pela força e pela integridade
do conjunto. O final sublime e terrível realça a condição essencialmente
moral do cinema insolente e malcriado de Sérgio Bianchi.
Avaliação:
Filme: Cronicamente Inviável
Diretor: Sérgio Bianchi Produção: Brasil, 2000
Com: Umberto Magnani, Cecil Thiré, Betty Gofman, Daniel Dantas,
Dira Paes Quando: a partir de hoje no Espaço Unibanco 2 e Sala UOL
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